terça-feira, agosto 22, 2006

PARA ENTENDER A HISTÓRIA REGIONAL

OCUPAÇÃO DO INTERIOR BRASILEIRO

Razões econômicas para a ocupação do interior: inicialmente a caça ao índio, depois para fornecer animais de serviço e carne os engenhos de cana-de-açúcar litorâneos, e mais tarde para as regiões mineradoras.

Transcrição de trechos do extraordinário livro do economista Celso Furtado: FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL (Publifolha, coleção Grandes Nomes do Pensamento Brasileiro):

“Em São Vicente, onde a escassez de mão-de-obra era maior, a primeira atividade comercial a que se dedicaram os colonos foi a caça do índio. Dessa forma, voltaram-se para o interior e se transformaram em sertanistas profissionais.

Os habitantes de São Vicente serão levados a penetrar a fundo nas terras americanas na caça indígena. Daí resultará o desenvolvimento em grau eminente da habilidade exploratório-militar, qualidade esta que veio a constituir o fator decisivo da precoce ocupação de vastas áreas centrais do continente sul-americano.

É provável, entretanto, que o principal fator limitante da ação dinâmica da economia açucareira sobre a colônia de povoamento do sul haja sido a própria abundância de terras nas proximidades do nucleio canavieiro.

Era relativamente pequena a porção do mercado da economia açucareira a que podiam ter acesso outros produtores coloniais. No setor de bens de consumo, as importações consistiam principalmente em artigos de luxo, os quais, evidentemente, não podiam ser produzidos na colônia.

O único artigo de consumo de importância que podia ser suprido internamente era a carne, que figura na dieta mesmo dos escravos, como observa Antonil. Era no setor de bens de produção que o suprimento local encontrava maior espaço para expandir-se. As duas principais fontes de energia dos engenhos – a lenha e os animais de tiro – podiam ser supridos localmente com grande vantagem. O mesmo ocorria com o material de construção mais amplamente utilizado na época: as madeiras

Ao expandir-se a economia açucareira, a necessidade de animais de tiro tendeu a crescer mais que proporcionalmente, pois a devastação das florestas litorâneas obrigava a buscar a lenha a distâncias cada vez maiores. Por outro lado, logo se evidenciou a impraticabilidade de criar o gado na faixa litorânea, isto é, dentro das próprias unidades produtoras de açúcar.

Os conflitos provocados pela penetração de animais em plantações devem ter sido grandes, pois o próprio governo português proibiu, finalmente, a criação de gado na faixa litorânea.

E foi a separação das duas atividades econômicas – a açucareira e a criatória – que deu lugar ao surgimento de uma economia dependente na própria região nordestina.

A criação de gado – na forma em que se desenvolveu na região nordestina e posteriormente no sul do Brasil – era uma atividade econômica de características radicalmente distintas das da unidade açucareira. A ocupação da terra era extensiva e até certo ponto itinerante.

As inversões fora do estoque de gado eram mínimas, pois a densidade econômica do sistema em seu conjunto era baixíssima. Por outro lado, a forma mesma como se realiza a acumulação de capital dentro da economia criatória induziu a uma permanente expansão – sempre que houvesse terras por ocupar – independentemente das condições da procura. A essas características se deve que a economia criatória se haja transformado num fator fundamental de penetração e ocupação do interior brasileiro.

Deve-se ter em conta, entretanto, que essa atividade, pelo menos em sua etapa inicial, era um fenômeno econômico induzido pela economia açucareira e de rentabilidade relativamente baixa. A renda estava constituída pelo gado vendido no litoral e pela exportação de couros. O valor desta última no século 18 – quando se havia expandido grandemente a criação no sul – não seria muito superior a cem mil libras (o valor da exportação de açúcar possivelmente superava os dois milhões).

O recrutamento de mão-de-obra para essas atividades (criatórias) baseou-se no elemento indígena que se adaptava facilmente à mesma. Não obstante a resistência que apresentaram os indígenas em algumas partes, ao verem-se espoliados de suas terras, tudo indica que foi com base na população local que se fez a expansão da atividade criatória.

Tudo indica que essa atividade era muito atrativa para os colonos sem capital, pois não somente da região açucareira, mas também da distante colônia de São Vicente, muita gente emigrou para dedicar-se a ela. Por outro lado, conforme já indicamos, o indígena se adaptava rapidamente às tarefas auxiliares da criação.

Sendo a criação nordestina uma atividade dependente da economia açucareira, em princípio era a expansão desta que comandava o desenvolvimento daquela. A etapa da rápida expansão da produção de açúcar, que vai até a metade do século 17, teve como contrapartida a greande penetração nos sertões.

Da mesma forma, nos século 18, a expansão da atividade mineira, comandará o extraordinário desenvolvimento da criação no sul.

A expansão pecuária consiste simplesmente no aumento dos rebanhos e na incorporação – em escala reduzida – de mão-de-obra.

É necessário ter em conta que a criação de gado também era em grande medida uma atividade de subsistência, sendo fonte quase única de alimentos, e de uma matéria-prima (o couro) que se utilizava praticamente para tudo.

P.S. – Clique
aqui para ler uma história, que se encaixa muito no relato acima, sobre sorocabanos que fundaram fazendas no Paraná e Rio Grande do Sul. Sobre a influência do tropeirismo que “contribuiu de forma decisiva para o desenvolvimento do Paraná, pois “o grande negócio a que se dedicaram os paranaenses desde meados do século XVIII foi o criatório e depois o comércio interno de gado vindo do Rio Grande do Sul para fornecimento dos mercados mineiro e paulista, em Sorocaba”.

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1 Comments:

Blogger Jorge Ramiro said...

Parece muito importante a história, em geral. Por isso, este blog é muito bom. Nós temos um grupo de história, e várias vezes por mês nos reunimos para estudar e, despois comemos em alguns restaurantes na vila leopoldina.

8:24 PM  

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